quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Nós, os animais irracionais, e eles, os racionais!

Quinta-feira, 02/02/2012


Nós, os animais irracionais, e eles, os racionais!

Publicado em 26/01/2012

Cássio Marcelo Mochi

O que devemos discutir é que tipo de sociedade estamos formando que permite às pessoas ocultarem a sua responsabilidade, atrás da suposta irracionalidade dos animais

Os gregos inovaram o pensamento ocidental quando introduziram o conceito de logos, ou mais conhecido entre os leigos como razão, o que abriu a perspectiva de o homem explicar o mundo e as relações consigo mesmo e o próximo.

Desde então a existência humana expande as suas fronteiras e novos direitos são conquistados a cada novo momento histórico. É notório que o termo “direitos humanos” aparece de forma muito evidente na mídia impressa, televisiva e através da internet, e amplamente discutido no meio acadêmico, independentemente da vertente metodológica utilizada.

Pois bem, não é mais possível aceitar que agir como “ser humano” seja apenas tratar o próximo de forma racional, e, aliás, mesmo nesse sentido, parece-nos que ainda estamos longe dessa condição, uma vez que uma parcela significativa da humanidade ainda passa fome e sofre injustiça das mais diversas formas.

Mas por onde caminha a nossa condição de “ser humano” quando nos relacionamos com os animais? Inúmeros são os casos recentes nos quais “seres humanos”, aparentemente normais, agridem animais domesticados e próximos de nosso convívio com uma brutalidade que contraria qualquer percepção de racionalidade, característica duramente conquistada pela humanidade ao longo de sua história.

O próprio Estado se encarregou de criar leis específicas de proteção aos animais e, pasmem caros leitores, essas leis não são tão recentes assim, como, por exemplo, o Decreto 4.645 de 10 de junho de 1934, na famosa Era de Getúlio Vargas, que já proibia e punia o mau trato aos animais, ou, ainda, a Declaração Universal dos Direitos dos Animais, proclamada pela Unesco, em 27 de janeiro de 1978, do qual o Brasil é signatário. Existem outras leis e algumas mais recentes, mas os homens não podem nortear a sua racionalidade apenas pelo império das leis, até porque a sua existência humana antecede o próprio Direito.

Quando maltratamos um animal, expressamos uma maldade injustificada cuja origem encontra-se no seio de nossa própria sociedade. Nós é que nos apresentamos como doentes e não os animais como seres irracionais. Cabe analisar que entre os animais, com raras exceções, o ataque a outro animal se dá por necessidade de alimentação ou proteção à sua vida ou da prole. Nunca por motivo vil ou diversão vazia.

A legislação brasileira, de longa data, afirma ser da responsabilidade do homem a agressão cometida pelos animais de sua guarda, quando a outra pessoa não provocou de forma deliberada a reação do animal, que se encontrava devidamente resguardado em local apropriado.
O que devemos discutir, até mesmo antes do aspecto jurídico, é que tipo de sociedade estamos formando que permite às pessoas ocultarem a sua responsabilidade, atrás da suposta irracionalidade dos animais. Parece-nos uma incoerência, pois a imensa maioria desses acidentes ocorre com os chamados animais domesticados. Mas quem domesticou esses animais? Será que tal fato não aconteceu pela própria irracionalidade do ato humano? Ou, melhor dizendo, pela forma irresponsável com que tratamos os nossos semelhantes e mesmo os animais sob a nossa guarda? Os nominados animais de estimação prestam um serviço brilhante à humanidade, pois expressam carinho, dedicação e mesmo lealdade com seus donos com tal intensidade, que chega a nos colocar diante dessa situação: quem realmente são os irracionais?

O amor, carinho, respeito e dedicação que devemos dar aos nossos animais de estimação refletem o quanto aperfeiçoado se apresenta o nosso caráter, além da felicidade em viver numa sociedade, onde todos os seres viventes e a natureza como um todo possam ser colocados num patamar de sublimação, de contemplação e de bem viver.

Cássio Marcelo Mochi, chefe do Departamento de Propedêutica do Direito, do Centro Universitário Curitiba (UniCuritiba), é professor de Direitos Humanos, Ciência Política, Direito Constitucional e Filosofia.



fonte: www.gazetadopovo.com.br/opiniao/conteúdo

Nenhum comentário:

Postar um comentário